sábado, 20/04/2024
A extrema pobreza no Brasil Foto: Agência Brasil

A decisão dos políticos: a redução da extrema pobreza

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Economia Herética/ Emerson Sousa

Quando da promulgação da Constituição Federal da 5ª República brasileira, em 1988, então batizada com a alcunha de “Constituição Cidadã”, o país possuía uma população total de 143,6 milhões de habitantes.

Segundo dados do Banco Mundial, 20,1% desse quantitativo sobrevivia com uma renda inferior a US$ 1.90 diários, ou seja, um contingente de 28,8 milhões de brasileiros tentava “se virar” ganhando algo em torno de R$ 132,81 por mês, a valores de agosto de 2020.

Dessa forma, uma população similar à soma daquelas atualmente encontradas nos estados de Minas Gerais e de Santa Catarina vivia em condições de extrema pobreza Brasil a fora, num quadro de absurda exclusão social.

Vinte e seis anos depois, esse volume de pessoas havia sido reduzido para 5,5 milhões, resultando numa situação onde 2,7% do total de habitantes vivia em situação de extrema pobreza (a soma das atuais populações da Paraíba e do Tocantins).

Essa redução foi de modo tão expressivo que se, em 1988, em números absolutos, o Brasil possuía 24 vezes mais miseráveis do que os EUA, em 2014, essa proporção diminuíra para 1,7 vezes.

E tudo isso se deu por meio de decisões políticas tomadas por políticos!

A  ação dos políticos

Entre 1989 e 1999, a queda no contingente de miseráveis foi de cinco pontos percentuais, por outro lado, entre 1999 e 2009, essa redução foi oito pontos percentuais. Já, de 2009 a 2014, a contração foi de 2,7 pontos.

Sob a perspectiva dos mandatos presidenciais, o mandato José Sarney governou um país no qual a miséria açoitava 18% da população. Durante o mandato Collor/Itamar essa média ficou em torno de 20%. Já nos oito anos do Sr. Fernando Henrique essa proporção foi para quase 13%.

Ex-presidente Lula Foto: Agencia Brasil

Acelerando esse processo, o governo do presidente Lula da Silva conviveu com um volume anual médio de 8% de miseráveis no total da população brasileira. De modo adicional, a presidenta Dilma Rousseff conduziu uma nação com uma média anual de 3,5% da população na extrema pobreza.

Todos esses resultados foram alcançados porque, principalmente, a Constituição Federal de 1988 procurou estruturar um sistema de proteção social que combatesse tais mazelas.

A criação do Sistema Único de Saúde (SUS), o estabelecimento do piso salarial para a aposentadoria, a organização da aposentadoria rural (que é um dos maiores programas de transferência de renda da história da humanidade), a constitucionalização dos direitos trabalhistas, o apoio ao municipalismo entre outras ações.

Também contou para isso a política de valorização do salário mínimo promovida pelos governos sociais-democratas do período 1995/2015 (PSDB/PT) e os programas de transferências de renda e as políticas públicas aprofundadas nos governos do Partido dos Trabalhadores (PT).

Com efeito, entre 2002 e 2014, por conta de um aumento real de mais de 33% em sua renda anual, o segmento que compreende os 50% mais pobres da população brasileira conseguiu a proeza de aumentar a sua participação no total da riqueza.

E tudo isso se deu por meio de decisões políticas tomadas por políticos!

O desenvolvimento humano

Nesse interregno, o Desenvolvimento Humano brasileiro também prosperou. Em 1991, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil era de 0,493 pontos, ou seja, um país classificado como de “muito baixo” nível de desenvolvimento.

Em 2010, esse indicador já estava em 0,727 pontos, alçando a nação a um estágio de “alto desenvolvimento”. O maior avanço se deu no indicador de educação. Em 20 anos, essa medida pouco mais que dobrou, saindo de 0,279 para 0,637 pontos.

Contudo, o Brasil evoluiu em todas as dimensões cobertas pelo IDH, também melhorando as condições de saúde da população e, por conta da redução da pobreza, o nível geral de renda.

Consequentemente, nessas duas décadas, 85% dos municípios brasileiros deixaram a condição de localidades com um desenvolvimento humano “muito baixo”, categoria que, em 2010, passou a ser composta por apenas 32 cidades. Por outro lado, mais de 40 localidades passaram a desfrutar um nível “muito alto” nessa classificação.

Como se vê, o Brasil experimentou um inédito e notável progresso em termos de saúde, educação e distribuição de renda, num tempo que, numa escala histórica, pode ser considerado relativamente curto.

E tudo isso se deu por meio de decisões políticas tomadas por políticos!

Um povo que não quer direitos

Contudo, tudo isso vem mudando desde 2013, quando o grosso da população brasileira passou a fomentar uma crise política que propiciou a ascensão de uma condução política que tem se empenhado em destruir os avanços proporcionados pela Constituição Cidadã.

Entre 2014 e 2018, a proporção da pobreza extrema no seio da população saiu de 2,7% e foi para 4,4%, conforme o Banco Mundial, o que significa que um contingente demográfico maior do que o do Rio Grande do Norte voltou a viver com menos de R$ 4,43 por dia.

Ademais, em 2015, a participação dos 50% mais pobres no nível de riqueza geral já decaiu 0,4%. Some-se a isso o fato de que, entre 2013 e 2015, a renda anual média desse mesmo grupo social diminuiu algo próximo a 8,9%.

Esse desmonte se dá através da aprovação de propostas como as Contrarreforma Trabalhista e Previdenciária, o Teto dos Gastos, a Emenda de Terceirização, além do constrangimento político das ações de intervenção social.

Sendo que tais medidas são promovidas para diminuir o poder de barganha dos segmentos populares, submetendo-os às mais diversas formas de aviltamento em seu estilo de vida. Não por acaso que, de 2013 a 2019, o rendimento médio mensal de uma pessoa ocupada, na Região Metropolitana de São Paulo, foi reduzido em 17,8%.

E tudo isso com o apoio de manifestantes nos mais diversos cantos do país!

Isso, claramente, não mira futuro algum!

Em suma, nos 25 anos entre 1988 e 2013, o Brasil conseguiu avanços notáveis no campo do desenvolvimento social. Esses prodígios foram conseguidos por meio da promoção das mais diversas formas de políticas públicas.

Diminuiu-se a pobreza, facilitou-se o acesso a serviços públicos, melhoraram-se os indicadores sociais e minoraram-se as agruras cotidianas de vastas frações do povo brasileiro. Contudo, esse mesmo povo não conseguiu compreender a realidade que o cerca e passou a se opor a toda essa estrutura de cidadania.

Indo contra o sentido das ações e decisões políticas que melhoraram as condições de vida no Brasil, de 2013 para cá, boa parte da população vem apoiando – e, em alguns casos, incentivando – o desmonte do sistema de proteção social brasileiro.

Paradoxalmente, o povo vem se levantando e se mobilizando contra a ações e decisões tomadas pelos políticos nesse mesmo ¼ de século.

Isso é um contrassenso, uma vez que não há exemplos em lugar algum da história em que povos evoluíram enquanto civilizações vulnerabilizando a posição dos seus elos socialmente mais fracos.

Olhe para os países europeus, em especial os escandinavos, e há de se perceber que o grau de desenvolvimento humano das nações é função da qualidade dos sistemas de proteção social.

Entretanto, nesse quesito, desde 2013, claramente, o Brasil não mira futuro algum!

(*) Emerson Sousa é Mestre em Economia e Doutor em Administração

** Esse texto é de responsabilidade exclusiva do autor.  Não reflete, necessariamente, a opinião do Só Sergipe

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Sobre Emerson Sousa

Economista Emerson Sousa
Doutor em Administração pelo NPGA/UFBA e mestre em Economia pelo NUPEC/UFS

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