terça-feira, 15/07/2025
Guerra de Titãs
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Guerra de Titãs: EUA x China e os conflitos regionais Israel x Irã e Rússia x Ucrânia

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Por Juliano César Faria Souto (*)

 

Vivemos um tempo de rearranjo profundo na geopolítica mundial. Enquanto o noticiário se concentra em bombas e fronteiras, por trás dos conflitos armados entre Israel e Irã ou Rússia e Ucrânia, há uma disputa muito maior em curso: a nova guerra fria entre Estados Unidos e China.

Não se trata apenas de comércio ou tecnologia. É uma batalha por hegemonia estrutural, envolvendo moedas, rotas marítimas, cadeias produtivas, recursos naturais e influência política global. Um tabuleiro tridimensional onde cada peça, cada guerra, cada silêncio é estratégico.

1. A Nova Guerra Fria: EUA x China como disputa sistêmica

A rivalidade entre as duas maiores potências do mundo não é episódica — é programática, estratégica e multidimensional.

Os Estados Unidos querem conter a ascensão chinesa em áreas cruciais: semicondutores, inteligência artificial, defesa, transações financeiras e infraestrutura digital. Para isso, lançam mão de sanções econômicas, controle tecnológico, alianças militares e pressão sobre os principais fornecedores da China – como Irã, Rússia e até Taiwan.

O campo tecnológico tornou-se o epicentro silencioso dessa nova guerra fria

A empresa taiwanesa TSMC, por exemplo, é responsável por mais de 50% da produção mundial de chips avançados, fundamentais para tudo — de sistemas de defesa a carros autônomos. Os EUA têm restringido o acesso da China a essas tecnologias, vetando a venda de chips de ponta por parte da NVIDIA e bloqueando a exportação de máquinas da ASML, empresa holandesa que domina a litografia ultravioleta extrema (EUV).

Por outro lado, a China investe bilhões para alcançar autonomia tecnológica por meio de programas como o “Made in China 2025”. Nesse esforço, empresas como a Huawei lideram o avanço do 5G em países da Ásia, África e América Latina, mesmo enfrentando sanções e boicotes diplomáticos de Washington.

Enquanto os olhos do mundo estão voltados para os conflitos armados, essa guerra digital e industrial molda o futuro com ainda mais impacto.

A China, por sua vez, articula sua resposta em múltiplas frentes:

Fortalece alianças com países sancionados.

Busca autonomia tecnológica e energética.

Realiza investimentos estratégicos em regiões-chave da África, Ásia e América Latina

2. Israel x Irã: um teatro indireto da disputa EUA x China

O recente acirramento entre Israel e Irã não pode ser visto como um conflito apenas religioso ou regional. Ele afeta diretamente a equação energética e estratégica da China.

O Irã é um fornecedor crucial de petróleo e gás para a China, fora da esfera de influência americana.

Faz parte do corredor econômico China-Irã, essencial para a Nova Rota da Seda.

Se o Irã for desestabilizado militarmente, a China perde:

Um dos seus principais pontos de apoio energético alternativo ao Golfo.

Barganha geopolítica com os grandes exportadores sob tutela ocidental.

A guerra no Oriente Médio não interessa diretamente aos EUA, mas pode servir ao objetivo estratégico de enfraquecer um aliado chave da China.

3. Rússia: enfraquecida, útil e refém

Na Ucrânia, a Rússia afunda num conflito sem fim, mas isso também atende a interesses geopolíticos:

Moscou perde força militar e prestígio diplomático.

Fica dependente economicamente da China, que compra petróleo e gás com desconto.

Para os EUA, o cenário ideal é:

Nem a vitória russa (que fortalece o eixo oriental),

Nem o colapso russo (que entrega Moscou de bandeja a Pequim).

A Rússia virou uma “carta fora do baralho”, mas ainda muito útil como distração.

4. Europa: entre a estagnação e a submissão

A Europa, outrora aspirante à terceira via geopolítica, hoje aparece dividida e limitada:

Militarmente dependente da OTAN e dos EUA.

Economicamente dependente da China.

Politicamente enfraquecida, presa entre pressões ideológicas e pragmatismo econômico.

5. Dois conflitos, uma mesma função: manter o status quo americano

As guerras da Ucrânia e do Oriente Médio não se resolvem porque não convém resolvê-las.

Servem para:

Enfraquecer os pilares estratégicos da China.

Evitar um bloco coeso sino-russo-iraniano.

Prolongar a vantagem relativa dos EUA, mantendo as potências emergentes divididas, pressionadas e em conflito indireto.

6. América do Sul e África: entre invisibilidade e potencial estratégico

E onde estamos nós, latino-americanos e africanos, nessa equação?

Somos ricos em recursos, mas pobres em coordenação e ambição.

A China é hoje o principal parceiro comercial de quase toda a América Latina e África.

Os EUA tentam conter esse avanço com: sanções, diplomacia tradicional, financiamentos condicionados.

Conclusão: uma guerra invisível, mas muito real

O grande projeto americano é simples: manter sua supremacia até onde der. Para isso, não é preciso vencer guerras. Basta prolongá-las.

A China, enfraquecida nos flancos (Rússia, Irã), tenta compensar com influência no Sul Global — mas também paga o preço da contenção estratégica.

Um convite à reflexão

Estamos no meio do tabuleiro, mas ainda fingimos estar na arquibancada.

O Brasil tem história, tem tamanho, tem recursos — mas falta diplomacia de Estado.

A verdade é: não temos voz própria. E sem voz, não há escolha.

Te convido, leitor, a refletir comigo sobre o que já fomos e o que ainda podemos ser.

 

Leia também:

 Lições de um Diplomata – Osvaldo Aranha e o Brasil que Pensava Grande

 

Na próxima semana, voltaremos com o Artigo 2:

“Brasil no novo tabuleiro: riscos, oportunidades e o preço da omissão.”

 

 

 

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Sobre Juliano César Faria Souto

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Estanciano, 61 anos, Administrador de Empresas graduado pela Faculdade de Administração de Brasília, com MBA em Gestão Empresarial pela FGV. Atua como sócio-administrador da FASOUTO, empresa do setor atacadista distribuidor e autosserviço.

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