terça-feira, 23/04/2024
Crianças na escola
Crianças numa creche da rede municipal de Aracaju Foto: Walter Martins/PMA

Educação infantil, direito e desobediência de gestores

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Coditiano
Valtênio Paes (*)

Decisão do Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 1008166 reafirmou a obrigação do poder público para ofertar creche e pré-escola às crianças de zero a cinco anos. Condicionou seu ajuizamento à comprovação de pedido administrativo prévio do não atendimento em prazo razoável e à incapacidade financeira da família de arcar com as despesas.

O ministro  Luís Roberto Barroso lembrou que existe a meta no Plano Nacional de Educação de inserir 50% das crianças brasileiras na pré-escola e creches até 2024. Atente-se que somente 31% das crianças brasileiras conseguem ter acesso à educação infantil. Já o ministro Gilmar Mendes comentou em seu voto que existe mais dinheiro para escolas militares do que para creches. Tal decisão recente é decorrente de recurso originado no município de Criciúma e, como tal, não poderia ser diferente.

Reafirma o que consta na LDB do ensino há anos conforme o artigo abaixo:

“Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de:

I – Educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, organizada da seguinte forma:
II – educação infantil gratuita às crianças de até 5 (cinco) anos de idade”

Agora temos uma lei que há anos estabelecia a obrigatoriedade, e uma decisão recente do STF que reconhece a obrigatoriedade da oferta da educação infantil pelo poder público, em especial, pelos municípios e Distrito Federal. Assim, o pedido de educação infantil pode ser judicializado.  Acrescente-se que o parágrafo 4º, do art. 212, da Constituição Federal de 1988, obriga, também, que os programas assistenciais inseridos no sistema educacional, tais como os programas de alimentação e assistência à saúde, podem ser estendidos às creches e pré-escolas.

No país, a presença da educação infantil é irregular. O Censo Escolar 2019 registrou 71,4 mil creches em funcionamento no Brasil, com 3.755.092 alunos matriculados. Do total, 34,6% dos estudantes de creche estão matriculados na rede privada e 45,3% em instituições conveniadas com o poder público. A rede municipal de ensino concentra a maior parte das matrículas da educação infantil: 71,4%. Em seguida, vem a rede privada com 27,9%.

Ademais, somente 10,5% das matrículas encontram-se na zona rural, e a quase totalidade (96,8%) das matrículas são atendidas por estabelecimentos da rede pública. Em relação às crianças de 0 a 3 anos, o percentual de atendimento em creches alcança 31%, de forma que é necessário garantir vagas para outras 2,2 milhões de crianças para se alcançar a meta de 50% de atendimento até o ano de 2024 estipulada no Plano Nacional de Educação (PNE).

A importância da educação infantil é inquestionável para melhorar a capacidade de aprendizagem das crianças. Segundo estudiosos, 90% das conexões cerebrais se estabelecem até os seis anos, por isso a criança precisa ser estimulada para desenvolver autonomia, concentração, sociabilidade, o cognitivo, o físico, dentre outros aspectos.  Se na família não acontecem esses estímulos e a criança não tem acesso à creche e pré-escola está fadada a ser prejudicada no seu desenvolvimento mental. Pais, mães ou responsáveis no exercício do dever educacional devem, também, contribuir para com essas estimulações.

De zero a cinco anos as crianças precisam de muitas experiências para estimular novas conexões cerebrais para seu futuro cognitivo, porque depois não terão condições de recuperar. Cada experiência nova vivida pela criança permite desenvolver a capacidade de sinapses entre os neurônios. É neste cenário que agem os neurotransmissores chegando às células do corpo humano ensejando ampliação de habilidades cognitivas.

As estimulações com brincadeiras, com a natureza, jogos presenciais, quebra-cabeças, escuta de histórias são, dentre outras, importantes. Assim, uma infância sem tais estímulos limitará as funções cerebrais dos infantes.  O rigor da lei e a decisão do STF impõem aos gestores, profissionais do ensino e legislativos, principalmente municipais, a obrigação do cumprimento da oferta de vagas para a população juvenil brasileira. Eis uma boa ação política administrativa em prol da educação escolar.

 

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(*) Valtênio Paes de Oliveira é professor, advogado, especialista em educação, doutor em Ciências Jurídicas, autor de A LDBEN Comentada-Redes Editora, Derecho Educacional en el Mercosur- Editorial Dunken e Diálogos em 1970- J Andrade.

** Esse texto é de responsabilidade exclusiva do autor.  Não reflete, necessariamente, a opinião do Só Sergipe.

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Sobre Valtenio Paes de Oliveira

Coditiano
(*) Professor, advogado, especialista em educação, doutor em Ciências Jurídicas, autor de A LDBEN Comentada-Redes Editora, Derecho Educacional en el Mercosur- Editorial Dunken e Diálogos em 1970- J Andrade.

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