terça-feira, 23/04/2024
A vida é curta, cabe a mim não torná-la pequena e/ou insignificante

“Aprendi a ser o máximo de mim mesmo”

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O tempo urge, o tempo não para. Na próxima segunda-feira, 11/07, completa 19 anos o acidente que mudou minha vida para sempre, deixando marcas indeléveis, que me transformaram em um novo homem. Mudei o olhar para a vida.

Final de tarde quente, 11 de julho de 2003, mesmo chovendo, calor intenso, causticante, típico do árido nordeste brasileiro. Estava a trabalho em João Pessoa, havia três meses sem ver a família. Aproveitei um final de semana para encontrá-los em Fortaleza, onde passaria alguns dias de folga, na companhia de Rodrigo e Frederico, filhos adolescentes, em férias escolares. Como na vida não se tem garantia de nada, o imponderável atravessou meu caminho, mudando o rumo da prosa, da hora, do dia, da vida. Cheio de planos e sonhos, com o grave acidente, acordei quebrado, sem saber o que a vida me reservara. “A vida é aquilo que acontece enquanto fazemos planos”, disse John Lennon, ele mesmo fruto do inesperado, assassinado aos 40 anos, em 08/12/1980, por um louco, no Central Park, em NY.

Aos 45 anos tive que encarar de frente um problema infinitamente maior do que eu, e agora, o que fazer? A vida não tem ensaio, é algo que se aprende fazendo; agora era levantar a cabeça, encarar as consequências do acidente, seguir em frente.

Sou dos que se exaspera com pouco, e mantenho a calma, para ver no que vai dar, com o muito. Todo quebrado, sem saber a gravidade, procurei acalmar a mente para não piorar o que estava ruim. O primeiro comando que dei para o cérebro: “Segura firme, não frita o juízo, não entra em depressão, pior do que estar, pode ficar”. “Não perde a fé”.

Desde muito cedo aprendi a lidar com as adversidades; assim como as coisas boas, as ruins também passam. Sou especialista em perrengues, filho das crises. O bom e o ruim não são para sempre. A roda do infortúnio gira para todos, chega até nós, depois segue seu curso.

O longo período de convalescença – internações hospitalares, centros cirúrgicos, 43 cirurgias, 100 horas de câmera hiperbárica –  foram situações que jamais pensei que passaria. Mas passei. O que não mata, fortalece.

“Às vezes você só percebe a importância de um momento quando ele se torna uma lembrança”, Sharpie Thoughts. Nunca sabemos a força interior que temos, até passarmos por algo superior a nós. A natureza humana é tão fantástica que desconhecemos a força que há em cada um de nós, até ela se manifestar.

Só quem passa pelo deserto, sabe o valor de uma chuva. Só quem passa pela luta, sabe o valor da vitória. Só quem passa pelas lágrimas, sabe o valor de um sorriso, só quem sabe o que é fome, saboreia um pedaço de pão. Se aprendermos que tudo na vida são lições, tudo fica mais leve e fácil. Procurei não me vitimizar, mas alimentar a mente com o que ela tem de melhor: fé inabalável no Deus Vivo, esperança de dias melhores. A vida não me cansa pois tenho uma irresistível vontade de que as coisas deem certo. Como Ariano Suassuna, sou um realista esperançoso. O bom de se chegar ao outono da vida, é ter visto muita coisa, visão de longo prazo, não se escandalizar com nada. Sempre que algo inusitado acontece, lembrar que há precedentes; tudo é cíclico, vai e volta.

Ninguém sai de uma situação como essa da mesma forma de antes; sai mais forte, resiliente, com o medo domesticado, consciente da presença do Deus Vivo. “Aprendi a ser o máximo de mim mesmo”, disse Nelson Rodrigues. Aprendi com o tempo, apreciar as boas coisas da vida. Criei o hábito de reservar um tempo, todos os dias, para fazer o que me dá prazer: ler, ouvi musica, fotografar entardeceres, comer o que gosto, uma taça de vinho, café no final da tarde, conversar com pessoas queridas, viajar, meditar. Quando vejo no meu entorno, pessoas reclamarem que não têm tempo para isso ou aquilo, penso: Oh! coitado, esse ainda não aprendeu nada da vida. Tudo é tão simples, e a maioria das pessoas assoberbadas com questiúnculas. E… o tempo está indo embora. A maioria está gastando seu bem maior – o tempo – a se digladiar por ideologias e posições políticas, nas famigeradas redes sociais, campo fértil para futilidade.

“A duração de minha vida não depende de mim. O que depende é que não percorra de forma pouco nobre as fases dessa vida; devo governá-la, e não por ela ser levado.”; “O defeito maior da vida é ela não ter nada de comple­to e acabado, e o fato de sempre deixarmos algo para depois.” Ou ainda: “Não deixemos nada para mais tarde. Acertemos nossas contas com a vida dia após dia”. Sêneca.

A vida é curta, cabe a mim não torná-la pequena e/ou insignificante.

“Ninguém se preocupa em viver bem, mas em viver muito; porém, todos podem agir de modo a viver bem mesmo que não saiba por quanto tempo.” Sêneca

E, parafraseando o escritor russo, Fiódor Mikhailovitch Dostoiévski, diante de sua bela Petersburgo: “Sou um sonhador; tenho tão pouca vida real, que momentos como estes que presentemente vivo, por demais preciosos, não posso deixar de os repetir nos meus sonhos. Sonharei consigo toda a noite, toda a semana, todo o ano. Amanhã sem falta, voltarei aqui, a este lugar, a esta mesma hora, e sentir-me-ei feliz por recordar o dia de hoje. A partir de agora, este lugar é querido aos meus olhos.”

“O que importa sair antes ou depois de um lugar de onde deveremos todos sair um dia? O que importa não é viver muito, mas viver com qualidade. Com efeito, viver muito tempo quem decide é o destino. Viver plenamente, o teu espírito.” Sêneca.

Dezenove anos depois, olhar para trás e ver que tudo que passei valeu a pena, foi aprendizado para chegar até aqui pleno, só posso agradecer a Papai do Céu pelo caminho percorrido. Vamos em frente.

Viver é bárbaro!

 

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(*) Luiz Thadeu Nunes e Silva é engenheiro agrônomo, palestrante, cronista e viajante: o sul-americano mais viajado do mundo com mobilidade reduzida, visitou 143 países em todos os continentes e autor do  livro “Das muletas fiz asas”.

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Sobre Luiz Thadeu Nunes

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Eng. Agrônomo, palestrante, cronista e viajante: o latino-americano mais viajado do mundo com mobilidade reduzida, visitou 151 países em todos os continentes da Terra. Membro do IHGM, Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão; ABLAC, Academia Barreirinhense de Letras, Artes e Ciências. Autor do livro “Das muletas fiz asas”. E-mail: luiz.thadeu@uol.com.br

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