quarta-feira, 24/04/2024
viver bem

Viver bem faz bem

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Luiz Thadeu Nunes da Silva
Luiz Thadeu (*)

-Bom dia!

-Bom dia? Como sabes se será um bom dia, se o dia está apenas começando?

-Não sei nem mais quando será um bom dia, continua ela, azeda.

Encerro a conversa, não gasto tempo com gente mal-humorada, gente que vive a reclamar de tudo. Se chove, reclama da água benta que Deus despeja sobre nós; se faz sol, reclama do calor, pragueja contra o clima.

Viajei com um sujeito que foi um verdadeiro teste de paciência e aprendizado.

Estávamos em um país diferente que o sujeito nunca tinha visitado. Em nenhum momento relaxou. De tudo reclamava; tudo era sem graça ou caro. Com três dias de viagem já queria voltar para casa. Para antecipar a volta era mais caro que a passagem original, tive que aturá-lo durante onze dias, fazendo ouvidos moucos para não enlouquecer, e não inviabilizar a viagem por completo.

Quando desembarcamos de volta ao Brasil, pedi ao bom Deus para não ter que lidar mais com o tal sujeito. Quem não é feliz no caminho não será feliz no destino.

Desconfio de que haja um sadismo nas pessoas que reclamam de tudo que encontram pela frente. Gente assim não gosta dela, oxalá dos outros. Se puderem exportar seus infernos particulares para os outros, melhor. Devem ter orgasmos múltiplos em infernizar a vida alheia. São pessoas que têm um problema para cada solução. Gente que dá dor de dente em serrote.

No retorno da viagem, precisei fazer exames laboratoriais de rotina. Com as requisições em mãos, em jejum, fui ao laboratório próximo de casa.

Na entrada do laboratório, fui recepcionado por dona Maria da Anunciação, que já conhecia.

-Booom diaaaa.

-Bom dia, dona Maria da Anunciação, tudo bem?

-O senhor não esqueceu meu nome. Está tudo bem graças ao bom Deus.

-Sente aqui, vou pegar uma senha preferencial para o senhor.

Chamado pelo painel, me encaminho para o atendente. Pergunta se trouxe o material para exame. Pede para aguardar para coletar o sangue.

Coletado o material, dona Maria Anunciação se aproxima, perguntando que tipo de café quero tomar no desjejum. Digo o que quero, ela vai até a máquina de café para me servir.

Sempre com um largo sorriso nos lábios. Enquanto tomo o cappuccino, conta que sai de casa às 5h, no primeiro ônibus. Chega cedo, toma seu café. Vaidosa, retoca o batom escarlate e começa trabalhar, distribuindo simpatia e amabilidade.

No dia anterior, precisei ir ao shopping. Estacionei o carro próximo à banca de revista; fui comprar um exemplar do JP com minha crônica. Perto da banca, avisto uma senhora sentada, ao seu lado um par de muletas. Desde que entrei para a tribo dos que precisam de muletas para se locomover, sempre puxo papo com quem faz uso delas.

– Como é o seu nome? Pergunto.

-Célia. Na verdade, meu nome de batismo é Zélia. Meu pai se confundiu e colocou o nome errado. Mas minha mãe me chama de Célia desde que me entendo por gente. Gosto de Célia.

-O que aconteceu com você?

-Nasci com os pés tortos.

Me conta que mora longe, na periferia da periferia, é viúva da Covid, tem três filhos. Um drogado vive na rua. Outra vive com as colegas, na vida nada fácil. A terceira é casada, “vive direitinho”.

Célia vende panos de prato, bordados por uma vizinha.

Todos os dias pega dois ônibus de casa até o shopping onde fez freguesia. “Sempre tem um filho de Deus que me paga um prato de comida”. “Nunca passei fome”, me diz ela com os olhos vivos.

Compro uns panos de prato, ela agradece. Abre um sorriso, me deseja as bênçãos de Deus.

Pego o exemplar do jornal, entro no carro, a vejo ainda sentada, contando os trocados que recebeu.

Reclamar é clamar duas vezes. Tudo na vida é energia.

Como tudo é relativo… tem gente que se você der um rio vai reclamar, outros estão satisfeitos com um copo d’água.

Quando aprendemos a ser gratos, aquilo que somos e possuímos se torna suficiente.

A gratidão é um caminho poderoso para a felicidade. Enquanto você agradece, a vida vai te reservando novas surpresas maravilhosas.

Alguém já disse que felicidade não é um lugar que a gente chega, mas o jeito como a gente vai.

Felicidade é aprendizado, uma construção contínua e permanente.

É Carnaval, que Papai do Céu nos livre do bloco dos chatos, negativos, reclamões, rabugentos e infelizes. Vamos cair na folia, na esbórnia, porque viver bem faz bem. Viva a alegria!

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(*) Engenheiro agrônomo, palestrante, cronista e viajante. O latino americano mais viajado do mundo com mobilidade, visitou 151 países em todos os continentes do mundo. Autor do livro “Das muletas fiz asas”.

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Sobre Luiz Thadeu Nunes

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Eng. Agrônomo, palestrante, cronista e viajante: o latino-americano mais viajado do mundo com mobilidade reduzida, visitou 151 países em todos os continentes da Terra. Membro do IHGM, Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão; ABLAC, Academia Barreirinhense de Letras, Artes e Ciências. Autor do livro “Das muletas fiz asas”. E-mail: luiz.thadeu@uol.com.br

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