segunda-feira, 22/04/2024
O consumo leve a moderado de álcool já não é mais uma opção segura Imagem: Pixabay

O vinho secou. E agora, doutor?

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E agora, doutor?

A ciência afirmou,

agora negou.

A taça secou.

A esperança sumiu,

O álcool acabou.

E agora, doutor?

Você que é sem dúvidas,

que ensina aos outros,

você que faz receitas,

protesta?

E agora, Doutor?

Está sem ciência,

está sem discurso,

está sem carimbo,

já não pode beber,

o vinho tinto expirou,

sem a utopia do benefício

para se encostar.

E agora, doutor?

Isso mesmo! O consumo leve a moderado de álcool já não é mais uma opção segura, dizem os mais recentes estudos!

Vamos saber mais sobre isso, afinal, essa notícia deixa meus nervos À FLOR DA PELE.

E agora, Doutor?

Nos últimos 50 anos, desde a observação do curioso fenômeno do “paradoxo francês”, os possíveis benefícios do consumo de álcool, mais precisamente do vinho, despertaram o interesse dos pesquisadores. E, desde então, muitos estudos confirmaram a tese desses benefícios. Claro que essa tese foi refutada por outra avalanche de estudos que contestavam esses benefícios atribuídos ao consumo de vinho, mas nunca  não conseguiram macular a imagem de bom moço desse milenar amigo dos bons amigos.

Antes de falar santo Vinho, vamos esclarecer o paradoxo francês. Na década de 80, pesquisadores constataram que os franceses apresentavam taxas de doenças cardiovasculares relativamente baixas, quando comparados com outros países ocidentais. Embora a dieta tradicional francesa fosse rica em gorduras saturadas, o que teoricamente deveria aumentar a incidência de doenças cardíacas,

Na corrida frenética para explicar essa intrigante equação, a ciência concluiu que o vinho, muito consumido na França,  possuía compostos e substâncias, como o resveratrol e outros polifenóis, com propriedades antioxidantes e, por isso, o consumo moderado de vinho tinto poderia exercer um papel na proteção contra doenças cardiovasculares por prevenir a formação de coágulos sanguíneos, reduzir o “mau colesterol” (o LDL) e melhorar a saúde dos vasos sanguíneos. E foi assim que o consumo regular de vinho se tornou a chave do “paradoxo francês”.

Na contramão dessas boas notícias, esses mesmos estudos destacavam que o consumo excessivo de álcool, inclusive do vinho, também era prejudicial à saúde, causando dependência, danos ao fígado e até aumento do risco de certos tipos de câncer.

Até aí tudo bem: consumo excessivo era prejudicial! Era isso!

Partido dessas duas premissas:

  • Consumo leve a moderado de vinho protegia o coração.
  • Consumo excessivo viciava, causava dano hepático e aumentava o risco de câncer.

E, com base nessas conclusões científicas, muitos países definiram diferentes recomendações de saúde e orientações gerais com limites de consumo das bebidas alcoólicas. Uma taça de vinho durante o jantar tornou-se o símbolo da moderação e da responsabilidade no consumo de álcool e transformaram-se, nas últimas décadas, nas palavras de conselhos médicos, quando o assunto era a ingesta alcoólica.

E muitos médicos, mundo afora, recomendavam e defendiam um consumo social de vinho para melhorar a saúde e prolongar a vida saudável.

Confesso que eu era um deles… e agora, doutor? Deixar minha santa taça diária não é algo que estava nos meus planos de vida… confesso mais uma vez. (imagine que se esse texto não estivesse na coluna de um dos mais importantes jornais digitais do Estado e do país, eu teria colocado um “KKKK” no final dessa frase…)

Nem uma tacinha?!…

Então, esquecendo as recomendações passadas, o que dizem os mais recentes estudos?

Será que não existe mais porta?

O mar secou?

E Minas não há mais?

Nem uma tacinha, é isso?

Vejamos, então, quais são as recomendações baseadas nas ultimas evidências científicas:

  • Pessoas abstêmias não correm mais risco de desenvolver doenças cardiovasculares quando comparadas com consumidores leves e moderados de álcool. Conclusão: vou poder parar de encher o saco da minha esposa… ela não precisa mais do vinho para me acompanhar até os 158;
  • Limites mínimos seguros não são mais recomendados, recomenda-se ingerir a menor quantidade possível a cada tomada, assim como, semanalmente. Conclusão: vinho deixou de ser remédio pra alegria… poder rir de sobriedade;
  • Evitar o consumo excessivo e episódico de álcool, conhecido como “consumo em binge”. Conclusão: faz muito mal tomar todas, mesmo só nos finais de semana; mesmo aquelas latinhas depois do futebol; mesmo nos encontros regados a pão, queijo, velhos amigos e algumas garrafas de vinho. Ou seja, beber quantidades excessivas de álcool em um curto período de tempo (binge drinking) está associado a sérios riscos à saúde, como lesões, acidentes e problemas crônicos;
  • Os efeitos nocivos do álcool são mais evidentes em mulheres quando comparados com os efeitos vistos em homens;
  • Jovens não devem consumir álcool, as últimas evidências mostram que os prejuízos superam de longe qualquer benefício;
  • Levando-se em consideração o custo benefício do consumo leve e moderado do álcool a longo prazo, os estudos atuais recomendam que homens não consumam álcool antes dos 40 anos e, se o fizer após essa idade, que o faça na menor quantidade possível;
  • Defende-se que os benefícios cardiovasculares atribuídos ao consumo crônico de álcool nas pessoas jovens não compensam os riscos relacionados ao desenvolvimento de câncer e doenças crônicas.
  • Pessoas que devem evitar completamente o consumo de álcool:
    • mulheres grávidas
    • casais tentando engravidar
    • pessoas com história de dependência alcoólica
    • pessoas com problemas hepáticos e renal
    • pessoas em uso de medicamentos que interagem com o álcool.

E agora, o que vou dizer para todos os meus velhos companheiros e companheiras de taça? E para meus pacientes?

Sou um crente nessa ciência errante. Acreditamos por 1.400 anos que a terra era plana; um dia, mudamos de ideia… errou quem não quis desacreditar. Acreditamos, por quase um século, que o átomo era como uma bola de bilhar maciça, homogênea, indivisível e indestrutível; um dia, mudamos de ideia… errou quem não quis desacreditar.

A ciência é isso… é como nós, contemporânea. As verdades de hoje podem ser o engano do amanhã. Precisamos estar preparados para trocar o couro das velhas crenças, mesmo que isso seque nossas taças e faça doer À FLOR DA PELE.

Então deixo aqui, meu toque pessoal:

– Os extremos costumam ser viciosos e a virtude costuma estar no meio. Fazer sempre e fazer nunca pode ter suas consequências. Moderação é a palavra!

– É importante equilibrar o prazer e a sociabilidade trazidos por uma ou duas taças de vinho num encontro entre amigos e amigas com os riscos potenciais à saúde quando esses limites são ultrapassados. Custo benefício é a fórmula!

Moderação é a palavra!

– Ninguém precisa consumir bebidas alcoólicas para manter uma boa saúde nem ser abstêmio é garantia de uma vida saudável.

– Se tiver que optar entre ser antissocial e solitário para evitar sair com amigos e amigas que tomam umas taças de vinho ou duas latas de cerveja… digo-lhe que a solidão é mais nefasta, a curto e longo prazo, do que uma taça de vinho. Viva a vida, você só tem essa!

– Até agora, a ciência não contestou nem inventou uma forma melhor para se alcançar a longevidade com saúde como a conseguida por meio de um estilo de vida saudável, baseado numa alimentação equilibrada e na prática regular de exercícios físicos. Movimente-se!

– Por trás do paradoxo francês, que tenta explicar a baixa taxa de doenças cardiovasculares, não existe apenas o hábito do bom vinho diário. Viver como “um bom francês”, talvez, seja o segredo. Esse bom estilo francês de vida inclui: uma dieta rica em alimentos frescos, como frutas, legumes e peixes, bem como uma cultura alimentar que valoriza as refeições compartilhadas e a moderação no consumo de alimentos. Modération, mais uma vez!

Espero que você goste e tire o melhor proveito dessas informações. Afinal, viver bem À FLOR DA PELE não é uma opção, é uma condição.

Um grande abraço,

Charles Albuquerque(*)

Charles Albuquerque

(*) Médico, expert em feridas.

 

 

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Sobre Charles Albuquerque

Charles Albuquerque
Médico, expert em feridas.

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