Por Luciano Correia (*)
Afinal, a história de que a seleção brasileira de futebol passaria a entrar em campo vestindo camisas vermelhas era ou não era uma fantasia inventada pelos profissionais da desconstrução da realidade, fazedores de fake news? Agora, com a honesta CBF se pronunciando, 48 horas após o boato, já podemos dizer que a possibilidade de termos um escrete vermelhinho virou pó. Sim, a CBF tem um lá um mal-assombrado que ganha uma fortuna no melhor emprego do mundo e não faz uma obrigação mínima, uma simples declaração, depois de dois dias do circo pegando fogo.
O circo pegando fogo. Sim, num país onde o debate de ideias sumiu inclusive e principalmente no campo da esquerda, o que outrora chamávamos de opinião pública passou a se exercitar, pra não perder o ritmo, em temas como este do uniforme escarlate. Mas se é nesse mundo que vivemos, distópico e intoxicado, é dentro dele que teremos que tecer nossas conjecturas. Senão aqui, onde então, se não há outro mundo, como cantavam os Novos Baianos.
O fato da CBF ter negado peremptoriamente que essa ideia não prospera, não significa necessariamente que se tratava de notícia falsa. Dentre os analistas experts que desde a terça-feira se revezam em profundas análises sobre o tema, alguns diziam que, a ser verdade, era, de fato, “um grande golpe de marketing”. Hummmm. Vamos lá.
Se na essência desse golpe genial de marketing estava uma negação veemente à vulgarização que a horda bolsonarista impôs ao fardamento da seleção nacional, não custa perguntar se no rol fabuloso e diverso do arco íris não existiriam outras cores capazes de marcar posição contra a vilipendiada camisa amarela. Isto considerando que os tais gênios do marketing nem lembraram que o segundo fardamento é o azul há décadas, tão ou mais lindo que o amarelo, além de tudo porque, afinal, azul é a cor do mar.
Já que ignoraram o belo azul, caberia experimentar o branco e o verde, ambos presentes numa coisa chamada bandeira brasileira. Ou a bandeira também se encontra cancelada no mesmo pacote que condenou a amarelinha ao degredo? Mas, se ainda assim não quisessem nenhuma cor deste símbolo também usado à exaustão pela escória golpista, restariam outras opções na paleta de cores ofertada pelo deus das cores. Um marrom, que tal? Rosa choque, para agradar os novos donos da esquerda brasileira, tão longe de Marx e Lênin, tão perto do frisson das redes. Ou cores que ninguém mais fala, como bonina.
O problema com o vermelho era evidente. Votei no vermelho tantas vezes antes. Deixei de votar em algumas eleições por candidatos que considerava melhores. Todos de esquerda. Esquerda sem festa, sem caviar nem verbas de emendas. Mas nos dois últimos pleitos tive de voltar aos vermelhos, face ao fascismo que apontava no horizonte com Bolsonaro destampando a tampa de um inferno que sempre esteve ali, só que envergonhado. Mas é triste ver um país tão rico e diverso, tão criativo e dinâmico, reduzir-se a duas versões maniqueístas do bem e do mal, sendo que os dois sabem e se nutrem disso. Se retroalimentam em causa própria. Se o outro não existisse, urgia inventá-lo.
Num contexto desses, pensar numa camisa vermelha é acender o palheiro, criar uma falsa polêmica que, ao final, não serve pra nada, afinal qual a importância dessa seleção de cabeças-de-bagre, comandada pelos piores treinadores do futebol mundial e dirigida por uma das entidades mais corruptas desse país gigante em corrupção? Gol que é bom, pimba na gorduchinha, nada. Que ninguém esqueça: se a seleção é a pátria de chuteiras, somos o país do 7 x 1, uma humilhação que nunca vai passar. E depois dessa vergonha, em vez de tomarmos a própria (vergonha), só fizemos piorar.
Botar a seleção de vermelho, no contexto em que pensaram, seria ideologizar uma das poucas paixões que ainda são consenso neste país. Ou, para usar o termo correto para os atuais senhores do poder, aparelhar o nosso futebol, como fizeram e fazem com tudo que põem a mão. Mas mais do que isso, seria uma estrondosa burrice. Não sei de qual cabeça saiu esse pensamento tresloucado.
A comunicação do governo, como numa peleja de futebol, sofreu substituição: saiu Paulo Pimenta e entrou Sidônio Palmeira. Conheço Sidônio dos tempos de movimento estudantil na UFBa. Ele era presidente do DCE e depois da UEE baiana. Rapaz inteligente, loquaz. Como marketeiro das campanhas de Lula e de muitas outras, repete a performance competente. Nos comerciais de TV ou nas notícias do Google já se sente a presença do seu trabalho, uma mudança positiva.
Mas a “sacada marketing”, se passou por ele ou sua gente, foi uma bola fora sem qualquer eficácia, ou, pelo contrário, um tiro no pé, ônus sem bônus. Todavia… todavia havia alguém fashion no caminho. E pensou que a militância ficaria tesudinha numa camiseta vermelha. Mas democracia não é isso? Nas arquibancadas a galera pode viajar por todo o arco íris, afinal, se até o Tremendão da Serra tem um fardamento preto (e, pior: faz sucesso!), por que não torcer pelo Brasil com uma vermelhinha insinuante? Mas gol que é bom…