Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos (*)
Sua singular e inconfundível voz firme, grave e anasalada me cumprimentava do outro lado da linha, seguida de um bom dia afetuoso. Ele fazia menção ao meu livro Contradições da Romanização da Igreja no Brasil – A Festa de São Benedito em Lagarto-SE (1771 – 1928), lançado pela Edise em outubro de 2016. Disse-me que o havia lido com atenção, com entusiasmo e de um só fôlego suas mais de quatrocentas páginas. Dirigiu especial atenção à memória que fiz do prelado, como ele, Monsenhor João Batista de Carvalho Daltro (1828-1910), um sacerdote simão-diense que foi vigário de Lagarto entre 1874 até a data de sua morte, estando seus restos mortais sepultados até a presente data na subida do altar-mor do Santuário de Nossa Senhora da Piedade.
Três anos depois, no dia 21 de outubro de 2019, nas dependências da Sociedade Semear, em Aracaju, por ocasião de minha posse na Academia Sergipana de Letras, já alquebrado pelo peso dos anos e por alguns problemas de saúde, sustentado por uma bengala e uma acompanhante, lúcido como sempre esteve até recentemente, prestigiou-me com sua presença, com um abraço fraternal e palavras de estimulo e de reconhecimento.
Estas e outras lembranças, guardo-as, em meu coração, do Monsenhor José Carvalho de Souza, membro fundador da Academia Lagartense de Letras e ocupante da cadeira de número 10, desde o dia 19 de abril de 2013. Atencioso e generoso, sempre que tinha uma oportunidade, me ligava para saber das novidades de Lagarto, de sua querida terra natal, de onde brotou para fazer fama e carreira na educação sergipana, no dia 24 de novembro de 1926.
Por muito pouco, não celebramos seu Centenário de Nascimento. Mas, quis Nosso Bom Deus colhê-lo da existência humana na última terça-feira, 26, aos 98 anos de idade. Uma trajetória de vida vitoriosa, doando sua inteligência, sabedoria e capacidade administrativa ao Colégio Arquidiocesano, afastado no ano de 2012. Afora ter sido um exímio pregador, ocupando cargos importantes na Igreja Católica de Sergipe e responsável pela evangelização e educação de algumas gerações desde os anos 50 do século passado.
Distante de Lagarto, fixando-se na região da Atalaia Nova, onde

recebia-nos com alegria e celebrava missa, em sua residência, com os mais próximos e cuidadores, Monsenhor Carvalho nunca deixou de visitar a Paróquia de Nossa Senhora da Piedade. Foram inúmeras as vezes em que participou de seu novenário e festa, como também da Semana Santa, quando, comumente, encerrava a tradicional Procissão de Senhor Morto, da Sexta-Feira Santa, com o Sermão das Sete Palavras.
Quando menino, queria ser fazendeiro, estimulado pelo seu avô Zacarias Júnior, que o criou, posto que ficou órfão em tenra idade. Mas, coube ao padre português, Monsenhor João de Souza Marinho, vigário de Lagarto entre os anos 1933 e 1953, despertar-lhe a vocação para o sacerdócio. Prelado importante, ele está entre os principais nomes da história da Igreja Católica em Sergipe, instituição que amou e zelou com a vida.
Sua ausência física certamente deixará uma grande lacuna entre todos nós, seus amigos, admiradores e confrades da Academia Lagartense de Letras, de modo particular. Mas, como homem de fé que foi, penso que ele para além de alcançar a imortalidade das letras sergipanas, também, com toda justiça, alcançou esta semana, com seu falecimento, a imortalidade na glória eterna que Deus nos reserva desde a criação da humanidade. Que Nossa Senhora da Piedade faça as honras da casa, amparando-o em seu colo sagrado e lhe restituindo as forças que ele desprendeu nessa aventura chamada vida, com tanto amor, desprendimento e dedicação.