Por André Brito (*)
Dia desses eu peguei a estrada voltando para Aracaju. As obrigações de trabalho me levam, quase todos os dias, a cidades do interior, fazendo valer meu amor por este lugar maravilhoso. Sol a pino, no velho meio-dia em ponto, encontrei uma parada boa de almoço na entrada feia de Rosário do Catete. Perdoem-me a sinceridade, mas as cidades sergipanas (raras as exceções) não capricham nas suas “recepções”. É uma pior que a outra. Já tive até vontade de fazer uma enquete: “Qual a entrada de cidade mais feia de Sergipe?”. A briga vai ser grande pra ver quem ganha (ou perde). Enfim, voltemos à história central.
Pedi um almoço, daqueles, cujas porções vêm separadinhas em tigelinhas de vidro marrom, trazendo uma memória afetiva que nos causa nostalgia e bem-estar. Mocotó, fígado, frango e carne do sol. Hummm… só delícias da nossa gastronomia. Fui devorando cada porção como a abelha suga o néctar da mais doce flor. Até que me deparei com a carne de sol sendo o último item da minha empreitada gastronômica.
Foi aí que me lembrei dos tempos de criança, quando, no almoço, sempre deixava a carne para comer por último. Para mim, aquela sensação do “grand finale” com a proteína era algo digno de príncipe. Só que havia um certo entrave na minha apoteose: na casa do meu pai (meus pais eram separados), meu irmão Alexandre sempre ‘roubava” minha carne, só para me ver irritado. Todo mundo ria. Irmãos têm sempre uma forma estranha de demonstrar amor. Assim era a dele. Por isso aprendi a ficar vigilante.
E, num pasmo de lembrança, durante o almoço em Rosário, estava eu a me lembrar docemente daquelas cenas acontecidas várias vezes. Inclusive, eu sabia que iriam acontecer. E acho até que permitia. Então eu e a carne nos olhamos, repetindo o gesto de criança, e me peguei entendendo que o menino ainda estava ali. E que, num desenrolar de fatos e lembranças, percebia que muito da minha infância ainda se mantém.
Eu não deixei que o menino André se perdesse no caminho, adultescesse. Sempre o trouxe comigo. E essa essência da felicidade do nosso estado pueril e intocável se mantém, mostrando-me todos os dias o quão é importante a criança em nós. Trazendo o tempo em que bolinhas de gude, pipa, pião, boizinhos de barro… elevavam a imaginação e a realidade não era a falta de roupas, de comida, de escolas caras… era o que tínhamos dentro no íntimo. E isso em mim não se perdeu.
Outro dia, eu me peguei atravessando o rio Sergipe, num tototó, para ir à Barra dos Coqueiros comprar geladinho de coalhada. Isso mesmo: geladinho de coalhada. Ou ainda, subindo no pé de cajarana e saboreando esta fruta deliciosa e, hoje, pouco conhecida.
– Cê vai cair!
– Caio não.
Realmente, só cai quem já se esqueceu de quem é!
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