Tácio Brito (*)
Ele acordou, no horário de sempre.
Levantou-se, tomou um banho, se vestiu, tomou café e escovou os dentes.
No caminho para o trabalho, passou pelas ruas de sempre, todas iguais aos dias anteriores.
Numa das casas de sempre, por alguma razão, notou uma pequena rosa que havia florido.
Seguiu seu caminho para o trabalho.
No trabalho, executou as mesmas tarefas de sempre: planilhas, planilhas, mais planilhas.
Até que, por alguma razão, lembrou-se da pequena rosa.
Por que aquilo ocorreu a ele? Por que ela era tão importante? O que havia demais nela?
Voltou ao trabalho, mas a pequena rosa estava lá. Era tão bonitinha, tão frágil, mas tão chamativa com suas cores e formas.
Há quanto tempo ela estava ali? Será que ele tinha passado por ela outras vezes e nunca a havia notado?
O que mais ele não havia notado?
Então ele olhou ao seu redor.
Percebeu-se notando as coisas, com a curiosidade de uma criança.
Ele notou que uma de suas colegas tinha pequenos adesivos de flores colados na sua baia.
Notou que outro colega mordia a tampa da caneta com frequência e agora ela estava bem gasta.
Notou até que sua cadeira de trabalho já estava gasta no estofado.
Ao fim de seu horário, recolheu suas coisas, guardou em sua pasta e percebeu que o material do qual era feita era bem macio.
Levantou-se para voltar para casa, como de costume.
Passou por um estagiário e, por alguma razão, notou a beleza na cor dos olhos daquele garoto. Foi de relance, mas suficiente para notar aquele verde amarronzado que lhe pareceu muito bonito.
Na recepção passou por uma colega e se percebeu encantado com o cheiro dela. Era de um aroma floral e refrescante. Por alguma razão, sorriu.
No caminho para casa, incomodou-se com o barulho dos carros. Eram mais altos e cacofônicos do que ele pensava.
Numa rua de costume, passou por um muro que estava pintado. Era uma bela pintura, um grafite que mostrava uma mulher sendo arrebatada pelas cores. Ela parecia tão em paz… Tão feliz… Tão viva!
Isso, ela estava viva! Esse pensamento aqueceu seu coração. Ele podia notar seus batimentos, sentia um formigamento percorrer sua cabeça, era uma compreensão diferente…
Como ele não havia notado aquela pintura antes? Como ele não havia notado as coisas que estavam ao seu redor? Eram tão óbvias ali…
Como ele tinha vivido até ali sem perceber essas coisas?
Então ele lembrou-se da pequena rosa, a pequena e delicada rosa naquela sacada. Ele tinha de revê-la, sua salvadora. Era agora uma questão de vida ou morte.
Ele correu. Correu como nunca tinha corrido. Sentia seu coração a ponto de pular do peito. Sentia suas pernas formigarem e coçarem. Seu rosto, ele sentia estar quente. Seu corpo parecia em chamas.
Então a reencontrou. A rosa que despertou nele aquelas sensações.
Parou sem fôlego diante dela. Respirou profundamente e, junto do ar refrescante, sentiu o cheiro da rosa.
Como algo tão pequeno era tão poderoso?
Quis a pequena rosa para si. Então a arrancou da roseira e levou para casa.
Ele estava feliz, agora sua vida parecia completa. Ele a tinha! Tinha a pequena rosa que mudou a sua vida.
Em casa, a colocou num bonito vaso, que ele nunca tinha se dado conta que tinha.
Estava muito cansado, aquelas novas percepções todas o haviam cansado demais.
Adormeceu numa poltrona em frente à rosa no vaso.
Quando acordou na manhã seguinte, percebeu o calor dos raios de sol em seu rosto. As cores da manhã lhe pareciam belíssimas.
Mas seu coração se apertou de imediato quando olhou para o vaso onde a rosa estava.
Ela havia murchado.
Em seu ímpeto, esqueceu-se de cuidar da forma correta. De colocar água, terra. E a pequena rosa, tão bela e delicada, perdeu seu brilho.
Ele sentiu uma tristeza enorme.
Uma tristeza que ele não sabia entender.
Então algo estalou na mente dele.
Lembrou-se do muro.
A pintura.
Sentiu uma estranha necessidade.
Lembrou-se de que tinha alguns lápis coloridos.
Por que ele tinha lápis coloridos? Se perguntava.
E então, numa folha qualquer, desenhou, da melhor forma que conseguia, uma rosa, aquela pequena rosa.
Estava diferente, claro, notou que não era dos melhores artistas.
Mas de alguma forma, ela estava ali. Era a lembrança da pequena rosa. A rosa que mudou sua vida.
Ele sentia que não podia esquecer-se dela.
E desde então tem pintado rosas.
Também plantou algumas em sua sacada, na esperança de que alguém, um dia, as perceba como ele percebeu.
E nunca mais ele foi o mesmo.
Desde que percebeu uma pequena rosa.
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