Por Luciano Correia (*)
A prisão domiciliar de Bolsonaro atiçou a nova paixão nacional, mais que novela e futebol: o chilique. Por alguns dias não se falou em outra coisa, com ameaças de fim de mundo para o caso de serem confirmadas as punições aos bandidos que tentaram um golpe de estado. Até a mesa da Câmara dos Deputados, essa instituição respeitável e vista com muuiitaaaa importância pela população, foi tomada por heroicos grevistas. O risco é a sociedade gostar de viver sem parlamento.
Na verdade, uma prisão domiciliar é uma punição meia boca, com o réu em casa, jogando videogame e comendo pão com leite Moça, o padrão gastronômico dessa figura improvável que só num país como o Brasil ganharia alguma importância. Mas é o Brasil, de miséria material, física e espiritual, onde político de rachadinhas apoiado por milícias criminosas é ídolo de pastores, juízes, promotores e empresários.
Trata-se de uma detenção com efeito meramente político, portanto, já que a vida real do infrator não fede mais do que já fedia. Num mundo de guerras virtuais, onde tacapes e bordoadas são desferidos a torto e a direito num tatame virtual, até o xilindró é de mentirinha. Pelo conjunto da obra realizada e pelo que está sendo julgado, Bolsonaro tem que ir para a Papuda, endereço do qual dificilmente escapará, afinal, bandido bom é bandido preso. Isto porque estamos numa democracia. A ver pelos vagabundos federais que tomaram de assalto (ops! Assalto?) a mesa da Câmara, bandido bom seria bandido morto. Mas a democracia não suja as mãos de sangue.
A barulheira diante de uma ordem de prisão que era a única medida cabível não pode ir além do furdúncio nas redes, até porque não poderíamos esperar outra coisa. São os tempos de uma interconectividade com eficácia de voo de galinha, que não abala os alicerces da vida real. Até o fato de o teatro de guerra ocorrer em palco virtual denuncia o isolamento de todos nós, que deixamos de viver a esfera pública analógica, de carne e osso, para as disputas simbólicas a troco de quase nada.
O diretor de cinema alemão Werner Herzog disse numa entrevista, ainda nos anos 90, que a solidão humana iria aumentar proporcionalmente ao avanço dos meios de comunicação de massa. Traduzindo em tempos de hoje, leia-se o poder das redes. O economista e escritor Eduardo Giannetti da Fonseca engrossa o caldo das preocupações e diz que a sociedade vive uma espécie de narcose digital, cujo efeito é o isolamento social, que afasta as pessoas e empobrece as experiências de vida, com a diminuição da capacidade cognitiva e da atenção concentrada.
As relações humanas vão se tornando cada vez mais superficiais. Quase ninguém mais lê um livro por mais de três minutos, porque para a leitura e vai ver o que está acontecendo nas redes sociais. No restaurante, as famílias esperam a comida sem se falar, com cada um clicando seu celular, disperso e envolto numa realidade distante. Até no cinema o sujeito busca o telefone para ver a timeline. O poder imantador da teleletrônica é avassalador e substitui a hegemonia da era da televisão, esta em pleno declínio. Mas a nova esfera pública digital não vai rasgar constituições e impor a força bruta dos atuais gangsters da política e das redes. Bandido bom é bandido preso.
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