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Por Luciano Correia (*)

 

Tom, soberano, em sua casa no Mosqueiro
Volta e meia, novas decisões de alguma instância do poder público agitam a vidinha simples dos moradores de seis dos mais bucólicos bairros aracajuanos, chamados a um só tempo, pela burrice, presunção e descaso de planejadores urbanos de Zona de Expansão. Tom, aquele gato mal-humorado que vive lá em casa, até pigarreou: “Zona é o pântano onde repousa a moral dos excelentíssimos”, bronqueou vetusto bichano, dando o assunto por encerrado. Mosqueiro, Areia Branca, São José dos Náufragos (olha que nome bonito!), Matapuã, Gameleira e Robalo são sítios aprazíveis formados por comunidades antigas e hoje reforçadas por autoexilados como eu, que me bandeei para os lados do Mosqueiro há 31 anos.

O guarnicho onde me escondo já foi até reenquadrado pela prefeitura, que nos localizou recentemente na Gameleira, jogando por terra meu honrado título de Cidadão Mosqueirense, conferido pelo conde Jorge Lins, que, aliás, nos trocou pelas delícias de um apartamento de cinco quartos, ar-condicionado centralizado, ofurô num dos banheiros-academia e quatro vagas de garagem. Tudo isso no novoriquismo da Farolândia, nas barbas da avenida Beira Mar. Para terem uma ideia, nesses anos eu já tive quase uma dezena de CEPs, a ver pelo gosto da gestão da prefeitura da época, ou da Câmara de Vereadores, ou Correios.

No vácuo de autoridade, até o CEP virou bagunça ao gosto do freguês que manda. E tome confusão na hora de um cadastro, uma compra, um documento oficial. Isto porque, até hoje, em uma ou outra situação, meu CEP atual é negado, com insistência dos atendentes alegando que “esse código é inexistente, senhor” e recorrendo a um outro já enterrado. De fato, num país com uma burocracia remunerada em padrões suecos e funcionando com qualidade Haiti, seria demais esperar integração entre os sistemas de Correios-Câmaras-Prefeituras. Vai Emurbs e vem Emurbs, e esses putos não resolvem nada.

Essa semana novo abalo sísmico assustou as preocupações dos moradores da “Zona” ante a possibilidade de violentamente serem incorporados ao território de São Cristóvão. Sim, é uma violência, porque não respeita vontades, autonomia, identidade e história. E mais: pela gravidade de entregar a gestão de 11 por cento do território aracajuano a um município especializado,  a exemplo de Socorro, em administrações as piores possíveis. Querem uma mostra: deem um passeio no Jardim Rosa Elze, esse bairro de nome tão terno e tão barbarizado pelo cinismo e desprezo das otoridades da velhacap. Isto se conseguir empreender o tal passeio, entre ruas estreitas, esburacadas, cheias de obstáculos, lama, esgoto e merda correndo a céu aberto. Se a infeliz população desse bairro tivesse um pingo de juízo, nos dias de eleições municipais acusariam zero votos para pretendentes a governantes.

Moradores dos conjuntos Sol Nascente, JK, Santa Lúcia e das centenas de condomínios que estão povoando a Jabotiana cada vez mais usam a antiga Estrada da Cabrita para irem até a UFS, Eduardo Gomes ou simplesmente chegarem à João Bebe Água em direção a São Cristóvão, passam por um estreito corredor polonês nas mesmas condições relatadas no Rosa Elze, sob trânsito pesado, já que ela reduz enormemente as distâncias. Quando saem de Aracaju e rompem o limite com a charmosa ex-capital, logo mergulham numa espécie de Beirute ou Gaza abandonada em solo sergipano. Descaso, descaso, descaso.

Após o frufru da última semana e a repetição do roteiro de sempre, é incrível que ninguém da chamada, ou ex-chamada, imprensa local, tenha tido a curiosidade e o dever jornalístico de fazer a pergunta que nunca tiveram coragem ou vontade: o que há por trás da insistente tentativa de roubar território aracajuano e sacrificar dezenas de milhares de moradores? Quais os atores que movimentam nas sombras esse xadrez infame e por quais interesses? A especulação imobiliária? Quem ganha e quem perde? E, por fim, por que a Justiça tem recorrentemente se comportado dessa forma? Quais razões têm motivado suas decisões. Decisões judiciais são para cumprir, mas, também, podem ser discutidas, não? São perguntas que poderiam ocupar as atenções de jornalistas, pelo menos os que não estão fazendo jornalismo chapa branca.

 

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Luciano Correia

Jornalista e professor da Universidade Federal de Sergipe

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