Cotidiano

“Só acontece no Brasil!” Será?

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Por Valtênio Paes de Oliveira (*)

 

Vez por outra escuta-se reclamos de pessoas manifestando-se pela frase “só acontece no Brasil” para insinuar incapacidade do povo brasileiro, numa expectativa de autoestima baixa, chamada por Nelson Rodrigues de “complexo vira-latas” desde 1958, como “inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo”.

São pessoas carentes de autoestima. Não conhecem outros países. Desobedecem padrões brasileiros na busca da autoafirmação, se apaixonam por ditaduras e conservadorismos, mas adoram olhar para o calendário do país. Esperam Carnaval, Semana Santa, festas juninas, feriados prolongados, Natal, Ano Novo, sexta feira e fins de semana antecipados etc. Possivelmente estão criticando o Globo de Ouro recebido por Fernanda Torres com o filme “Ainda estou aqui” dirigido por Walter Salles.

No início da década de 1970, o Brasil enfrentava o endurecimento da ditadura militar.  Um dia, Rubens Paiva — líder estudantil, político, engenheiro e jornalista — é levado por militares à paisana e desaparece. Sua esposa Eunice não desistiu da busca pela verdade sobre o destino do marido por décadas, até que a Comissão da Verdade  e os tribunais confirmaram as torturas e o assassinato.

O filme falado em português rompeu a dominação do inglês e dos países acima da linha da do Equador com a bela interpretação da atriz brasileira. A tragédia histórica abordada em “Ainda estou aqui” se passou com Eunice Paiva e família, retratando o sofrimento e a persistência por Fernanda Torres com base no livro de Marcelo Rubens Paiva.

Quebrar o monopólio rigoroso europeu e norte-americano na escolhe de melhor ator/atriz, onde parecia que o resto do mundo não produz arte cinematográfica acima da linha do equador, é inédito. Fato histórico e revigorante, orgulha qualquer brasileiro(a). Motivo de júbilo para a arte brasileira. Lamentável que pessimistas de plantão continuem exercendo o complexo vira-latas. Fernanda Torres com a interpretação acontece mais uma vez para o Brasil e o mundo.

Ao longo do tempo, a viúva se reinventou, estudou Direito e foi aos tribunais em busca da verdade do assassinato de esposo. Obstinação e tenacidade pela história real e respeito pela memória do esposo e do país. Obteve resultados processuais nos tribunais quanto à morte do esposo cujo corpo nunca fora encontrado.

Talvez o cerne do “só acontece no Brasil” esteja num patamar que os pessimistas não têm condição de percebê-lo, examiná-lo e utilizá-lo com orgulho e prazer. O Brasil nos permite razões ilimitadas para enterrar o complexo vira-latas com sua pujante cultura, ciências, letras, artes e neste momento, na sétima arte.

 

 

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Valtenio Paes de Oliveira

(*) Professor, advogado, especialista em educação, doutor em Ciências Jurídicas, autor de A LDBEN Comentada-Redes Editora, Derecho Educacional en el Mercosur- Editorial Dunken e Diálogos em 1970- J Andrade.

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