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Reclamos de recém-nascido

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Valtênio Paes de Oliveira (*)

 

Muitas pessoas exclamam: “Que linda criança!”. Logo nos tomam nos braços, beijam e afagam, sem pudor e sem qualquer precaução higiênica. Aproveitam para levar bactérias e congêneres ao nosso corpo indefeso. Ai dos pais que rejeitem o gesto afetuoso — tornar-se-iam indelicados com os visitantes.
Outras pessoas postam nossas imagens nas redes sociais, interferem na relação dos genitores, opinam e tomam atitudes em relação ao recém-nascido que contrariam seus valores e propostas educativas.
Geralmente, agem assim pelo simples “prazer” de interferir. Esquecem-se de que quem visita deve se adequar aos costumes e necessidades de quem é visitado.

“Quando chegarmos à idade adulta não se sabe como serão nossas reações jurídicas e emocionais ao tomarmos conhecimento do uso de nossas imagens enquanto indefesos recém-nascidos.” Crianças não são troféus de campeonatos que os ídolos exibem à distância, aos torcedores. Criança deve ser fruto de uma relação amorosa, e por conseguinte, pertence à unidade familiar, quer seja homem x mulher, homem x homem, mulher x mulher. A ninguém é dado o direito de exibi-la em redes sociais, por se tratar de direito de personalidade.

Na sociedade atual aparecem com frequência pessoas visitantes com várias características. Eis algumas:

1-fantasiosas: fazem “festas” com comidas, bebidas e músicas de adultos para homenagear um ser sem discernimento. Comemora-se aniversários mensalmente. Depois que a criança cresce, esquecem a existência. “Torram elogios graciosos, postam imagens nas redes sociais sem autorização, nos expõem, por proximidades, às radiações de celulares e congêneres. Esquecem que nossos cérebros estão formação, e doenças neurológicas futuras, poderão nos atacar.” Não se encorajam de ter filhos, nem tão pouco, colaboram com crianças necessitadas. Pior ainda, esquecem de preservar o período puerpério da genitora.

2-indiferentes: crianças suas ou de outras pessoas não lhes sensibilizam. Algumas rejeitam, preferem até “humanizar” pets. Degeneram o lado humano, encastelam-se em justificativas individualistas por comodidade social ou instinto pessoal. “Outras justificam pelo ‘não tenho tempo’ e nos põem em ‘hotelzinho 24 horas’. Quando ficarmos adultos vão nos cobrar amor e apoio para suas velhices.” Será possível viver sem conhecer amor e carinho e depois praticá-lo?

3-omissas: têm o dever social, moral e legal de cuidar da criança, porém abandonam. Fogem, sem justo motivo, da responsabilidade. “Deixam em instituições de caridade, praticam atos violentos, até nos deixam em lixeiras.”

4-interferentes: não deixam a mãe repousar do parto e já aparecem. Não dão sossego nem à mãe nem à criança recém-nascida pois se acham no direito de adentrarem no seio dos costumes familiares e agem como se a criança fosse sua. Trazem objetos, praticam atos que contrariam pais e o humor e saúde da criança. Depois se vão. Tempos depois, voltam e nova saraivada de ações inconvenientes. Têm ciúmes do ciúme protetivo dos pais, mas não querem filhos. São interferentes e inconvenientes.

5-colaborativas: prestativas, disponibilizam tempo, ensinam, ajudam quando solicitadas, protegem a saúde do recém-nascido, somando-se aos atos educacionais da família. Praticam pedagogia materna e paterna com respeito e desejo de servir. “São importantes tanto para nós como para as mães, pais ou responsáveis, pela transferência de saber e carinho colaborativos.”

“Somos indefesos”

A beleza do nascimento é indescritível. “Fomos gerados sem pedir, vivemos nove meses num mundo que ficou pequeno. Adentremos noutro, só nos comunicamos com choros e resmungos. Tudo é novo: da ignorância à sabedoria, do ódio ao amor. Poucas pessoas nos entendem, somos carentes e dependentes de amor pleno, precisamos de pedagogia da paciência civilizatória. Verdade seja dita, mesmo assim, gesticulamos, choramos, rimos, cagamos e peidamos a hora que queremos, sem pedir licença e em qualquer lugar.  Muitos acham graça da nossa suposta liberdade. Aprender com adultos é complicado, pensam que agimos conforme os valores deles. Cada um traz lição diferente.”

Somem-se a tudo isso a necessidade de recheios de tempo, paciência, dedicação, aprendizado e amor. “É uma opção com responsabilidades nos trazer ao mundo.” Renúncia que muita gente não se propõe, e vez por outra, inferniza o recém-nascido e seus pais ou responsáveis. Profissionais da saúde e magistério que digam. Algo além do ato da procriação, de trazer outro humano para este planeta. “Somos indefesos que se comunicam através do choro e do resmungo, não podemos ficar aos caprichos de curiosos momentâneos. Precisamos de ambiente sereno, acolhimento e carinhoso para aprender, conviver e evoluir.”

“Talvez sejamos o animal de maior dependência alimentar para sobreviver.” Tem adulto que molha chupeta na cerveja e coloca na boca de criança; em plena pandemia, adulto bebendo, beijou mão de criança. Fala-se que no Brasil já existem mais pets do que crianças por família. Triste para quem está chegando. Não conhecemos suas linguagens, seus sons ou movimentos. “Conhecemos apenas nossas mães. Por favor parem! Deixem-nos acostumar com este planeta para fazermos nossas escolhas. Ainda teremos muita conversa e convivência com nossos pais. Quem gosta ou ama, cuida, protege e preserva, não conflita!”

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Valtenio Paes de Oliveira

(*) Professor, advogado, especialista em educação, doutor em Ciências Jurídicas, autor de A LDBEN Comentada-Redes Editora, Derecho Educacional en el Mercosur- Editorial Dunken e Diálogos em 1970- J Andrade.

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