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Por Tácio Brito (*)

Permita-me convidá-lo a observar comigo… Você já notou como o mundo se tornou um baile de máscaras perpétuo? Não me refiro àqueles de Veneza, com sua elegância barroca e mistério planejado. Falo de um carnaval dionisíaco muito mais desesperado, uma cena quase ensoriana na qual não se dança ao som de minuetos, mas ao ritmo frenético de uma incerteza que se tornou a própria música de fundo de nossas vidas.

Neste baile, cada um de nós, sentindo o chão tremer sob os pés de uma realidade que se recusa a ser fixada, corre para o guarda-roupa da identidade e escolhe uma máscara. E outra. E mais outra. Forjamos para nós mesmos estandartes e insígnias, taxonomias de ser cada vez mais específicas.

Cada rótulo é um fio de ouro costurado em nossa fantasia, uma promessa de nos fazer importantes para um grupo X ou Y.

Mas esta promessa de pertencimento é uma armadilha. Buscamos a conexão e encontramos a mais sofisticada forma de solidão. Com a faca cega da ansiedade, começamos a nos talhar, a aparar as arestas da nossa psique complexa, para cabermos na geometria simples do rótulo, aterrorizados pela possibilidade de ficarmos sós, desconectados. O rótulo, que deveria ser uma ponte, torna-se a medida da nossa cela.

O perigo mais insidioso é quando o ator se esquece de que está em cena. A máscara-rótulo, adotada por medo, solidifica-se e torna-se um dogma. O ser humano, que é pura possibilidade, petrifica-se na estátua mais exemplar possível daquela identidade. Torna-se o sumo sacerdote de seu próprio rótulo, disposto a erguer muros, a ferir e a se isolar para proteger a santidade de uma definição que ele mesmo escolheu para se aprisionar.

Como venho explorando em minha jornada, este baile é a antítese da liberdade. É a busca por um propósito externo quando o único trabalho verdadeiramente sagrado é a Divinitas Sinthesys, a forja do significado dentro da própria alma. É a recusa em escrever o próprio Codex Vitae, em ser o autor da própria narrativa, preferindo a conveniência de um personagem com falas prontas. É o medo de habitar a “Casa Inabitada” de si mesmo — esse parlamento de vozes e multiplicidades internas — , preferindo acampar no jardim seguro de uma identidade coletiva.

A libertação, eu suspeito, não reside na fantasia de viver sem uma máscara, mas em aprender a distinguir a máscara-rótulo da máscara-lente.

máscara-rótulo é a que vestimos para os outros. Sua função é a classificação e a validação externa. Ela responde à pergunta: “O que eu sou para eles?”. Ela é uma prisão.

máscara-lente, contudo, é a que usamos para nós mesmos. Sua função é a perspectiva e a conexão. Ela responde à pergunta: “Como posso ver o mundo — e a mim mesmo — de outra forma?”. É uma ferramenta transitória de empatia e compreensão. É vestir a lente do Herói, não para ser aplaudido, mas para compreender a natureza da coragem. É usar a lente do Eremita, não para se isolar do mundo, mas para escutar o que o silêncio tem a dizer. É olhar através dos olhos do outro, não para se tornar o outro, mas para alargar os limites do seu próprio universo.

Forjamos para nós mesmos estandartes e insígnias, taxonomias de ser cada vez mais específicas

O objetivo não é se perder, mas se expandir. O propósito não é a classificação, mas a conexão. É usar estas lentes para criar uma empatia verdadeira, livre da necessidade de se moldar, permitindo-nos conectar com os outros não apesar de nossas diferenças, mas através da compreensão delas.

E agora, se me permite uma confissão neste salão barulhento, a máscara que vesti para escrever este texto é a do filósofo. É uma lente poderosa, bem-acabada, e me serve bem para articular estas ideias.

Mas é apenas uma das muitas que guardo.

Retire-a, e o que você encontrará não é um sábio com todas as respostas. É apenas um homem. Uma arena onde estas mesmas batalhas são travadas, uma consciência que, assim como a sua, está apenas tentando aprender os passos desta dança estranha e magnífica. E, talvez, essa seja a única verdade que importa quando a música para.

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Tacio Brito

Tácio Brito é empresário, consultor de cultura e inteligência artificial, polímata, mestre maçom da ARLS Universitária Sergipe D'El Rey Nº 4703

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